História

ARTIGO LEVANTADO DO JORNAL “NOTÍCIAS DOS ARCOS”, ELABORADO POR UM ILUSTRE ARCUENSE, PUBLICADO A 9 DE AGOSTO DE 1953 E EDIÇÕES SEGUINTES.

 

ARCOS DE VALDEVEZ TAMBÉM TEM BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS

 

Dantes, chamavam-se aos Bombeiros Voluntários «Soldados do Bem». A Humanidade vivia tranquila e como que conformada com a sua sorte. Mas vieram as guerras, e a palavra PAZ readquiriu o seu prestígio, mais alto que nunca. Foi por isso, talvez, que se passou a chamar--se-lhes «Soldados da Paz».

Do Bem, ou Da Paz, qualquer dos títulos lhes assenta esplendidamente. Prefiro, todavia, o primeiro, porque a sua missão não é propriamente promover a paz, mas praticar o bem, tanto na paz como na guerra.

A sabedoria popular ensina-nos que «vêem-se caras, não se vêem corações». Este conceito, porém, não se entende com os bombeiros. Quem vê uma farda de bombeiro vê um coração.

Dizia-me um bombeiro voluntário lisbonense, minhoto dos quatro costados: «Quando passo fardado por um paisano, dá-me vontade de lhe dizer: «És um pateta. Nem sabes o que vales. Olha bem para mim, veste uma farda destas e verás que és outro. Não passas dum pateta, mas mesmo assim, se precisares cá do rapaz, estou pronto a arriscar a minha vida por ti».

Só aquelas que já alguma vez envergaram essa nobilíssima farda, podem compreender bem o que isso representa. Ao afivelar o cinto, é como se uma alma nova surgisse dentro de nós, uma alma que nós próprios ignorávamos existisse no nosso íntimo. E apetece, logo, fazer um desafio: onde está esse perigo, que quero afrontá-lo? Onde está a DOR, que quero mitigá-la? A Morte onde está, que quero lutar com ela? É essa alma, que está na psicologia dos heróis, que faz das fraquezas forças, encurta distâncias, desaterra montanhas, faz trepar escadas, abafa as mais gigantescas chamas da desgraça, e termina, quantas vezes, no hospital ou no cemitério, com um desabafo sublime: Cumpri o meu dever!

Achegos para a história da nossa Associação dos Bombeiros Voluntários

Dizer-se como e quando se fundou esta Associação, não é tarefa tão fácil como poder parecer à primeira vista. O arquivo da colectividade é bastante precário, faltando muitos livros e documentos, retirados não se sabe por quem nem porquê. Só quem os desviou o poderá explicar. Dos primeiros anos não existe absolutamente nada, e os jornais da época que pude consultar não se alargaram muito. Ao apresentar, portanto, um pouco dos meus apontamentos (modestos, é certo, mas coligido com algum trabalho e paciência), não pretendo oferecer obra perfeita. É apenas pelo muito interesse que me merecem todos os assuntos – passados, presentes e futuros – respeitantes à minha terra natal, e para estímulo de outros que saibam e possam fazer melhor.

Verdadeiramente, a nossa Associação dos Bombeiros Voluntários, nasceu dum provérbio que diz: «depois da casa roubada, trancas à porta». Talvez muitos arcuenses ignorem que, antes de existir o actual TeatroTeixeira Coelho (hoje pertença dos bombeiros), houve, no mesmo local, um primitivo teatro chamado «João de Deus». Inaugurou-se solenemente em 6 de Janeiro de 1887, mas foi destruído por violento incêndio na noite de 10 para 11 de Agosto de 1888. Como «depois da casa roubada, trancas à porta», logo nesse mês se constituiu uma comissão angariadora de donativos para compra de uma bomba. Presidia a essa comissão o dr. Silvestre Saraiva (o «Saraiva das forças», como era conhecido em Coimbra, no seu tempo de estudante), ignoro, porém, os nomes dos restantes componentes. Os donativos eram cobrados na loja de António Luís Dionísio Mendes, no Largo da Lapa, sita numa casa que foi demolida quando da abertura da actual Rua do General Amílcar Mota. Por fins de Novembro desse mesmo ano, já a comissão recolhera o suficiente para juntar aos 200$000 rs. com que a Câmara contribuíra. Ao fazer entrega a esta entidade, o dr. Silvestre Saraiva (conta-nos o n.º 143 do jornal «O Arcoense») ofereceu-se para organizar uma associação de bombeiros voluntários, com a condição de a Câmara entregar a essa colectividade todo o material que tivesse adquirido. Certamente o pacto foi firmado pois em 6 de Maio de 1889, a assembleia geral aprovava os estatutos da novel associação. Assim o dizem os próprios estatutos, de que possuo um exemplar impresso nesse ano.

Será esta a data que se deve marcar para a sua fundação? Se houve uma assembleia geral e não uma simples reunião, é porque já havia a colectividade, embora ainda não aprovada superiormente. O «Alvará de Approvação» de os «Bombeiros Voluntários dos Arcos do Valle do Vez» tem a data de 29 de Julho de 1889, assinado pelo Conselheiro governador civil, A. Alberto da Rocha Páris. É esta, pois, a data da fundação?

Em 25 de Agosto, seguinte, reunia-se a assembleia geral para eleição da direcção, que ficou assim constituída: Pres. Dr. Silvestre Saraiva; Vice-pres. João Cândido de Gusmão e Vasconcelos; 1.º Sec. Francisco Xavier de Araújo; 2.º Sec. Manuel Pereira de Sá Sotto-Maior; Tesour. Manuel Palhares Nogueira Falcão. No dia imediato elegeram os comandantes; 1.º Vergílio Martins da Costa; 2.º João da Rocha Vaz.

Mas não fazia sentido uma associação de bombeiros, sem bomba. Foi ela construída na casa de António Moreira da Silva Couto, do Porto, onde esteve em exposição. Conta «O Primeira de Janeiro», que estava a realizar-se um congresso de bombeiros, e os congressistas visitaram a oficina e muito admiraram a nossa bomba (invento daquele construtor) considerando-a uma das melhores do país e rivalizando, perfeitamente, com as do conceituado alemão Jauck. Era leve, desmontava-se com rapidez, e os homens às picotas podiam elevar o jacto até à altura de um 5.º andar.

A bomba, acompanhada do construtor e seu filho, recebida com música, foguetes e muito entusiasmo, chegou aos Arcos no dia 1 de Outubro de 1889.

É esta data que o jornal «O Bombeiro» (N.º 7) considera como fundação da colectividade. O número de 1 de Outubro do ano seguinte, do mesmo jornal, diz que se comemora – hoje - o 1.º aniversário e envia felicitações. E mais uma opinião… Porém, é aos sócios que compete, em assembleia geral, fixar, em definitivo, qual a data que deve ser considerada como a da fundação. Se me permitem, vou pela de 5 de Maio de 1889, por ser a mais antiga e porque a antiguidade também dá valor à nobreza.

 

E a bomba foi para a Barca

Dois dias depois da chegada da bomba, fizeram-se as devidas experiências. Primeiro trabalharam 2 mangueiras de bocal largo para serviço de rescaldos. Os resultados foram absolutamente satisfatórios e excederam, até, toda a expectativa.

Pena foi que esta bomba, verdadeira relíquia, fosse vendida, não há muitos anos, à casa A. Paredes Granjo, de Vila Nova de Gaia, que, por sua vez, a cedeu aos bombeiros voluntários da nossa vizinha vila da Ponte da Barca, e ainda hoje funciona regularmente.

Daquela corporação é distinto 2.º comandante o nosso conterrâneo sr. José Barreiros, filho de Virgílio Mastins da Costa, que foi, como disse, o primeiro comandante do nosso corpo activo e presidiu às primeiras experiências. Parece que a dita bomba não que sair da família.

A primeira baixa

A registar nos anais da nossa Associação, como primeira nota triste, é a data de 6 de Novembro de 1889. Morreu nesse dia o bombeiro Adolfo José de Araújo vítima de um antraz. Era um modesto e jovem artista latoeiro, que em breve cedia a outro a farda quase por estrear. Foi conduzido a S. Bento por todos os seus colegas. Junto da campa falou em nome da Associação, Augusto Silva (jornalista e poeta que deixou certo renome) e José Esteves como amigo do falecido.

Pobre Adolfo: sonhou talvez, poder ostentar no peito a medalha dos heróis; romper por entre as labaredas e salvar não importa quem, nem o quê. Não sei se na sua campa estava algum epitáfio, mas bastava só isto: «Aqui jaz um bombeiro».

Ela que não faltasse…

Não tardou que a política metesse o nariz. O dito José Esteves (O Zé Riquinho), jornalista de mérito mas muito esturrado, publicava no «Jornal do Vez» do supra dita mês e não, um artigo em que dizia: «A tal instituição já se vai tornando pesada e por isso já muita gente pergunta qual será mais prejudicial, se a bomba, se os incêndios… Os bombeiros reúnem-se ali todas as noites a pretexto de exercícios, e percorrem com luz a casa toda, diz-se que acompanhados de bombeiras. Ora nada mais fácil que por esta forma peguem fogo à casa».

Achava-se a Corporação instalada nos baixos duma casa que Manuel Joaquim Rodrigues, (ausente no Brasil) alugara à respectiva senhoria. Onde era essa casa, nenhuma das pessoas de idade, que consultei, me soube dizer.

A intrigazinha provocou grande celeuma. A restante imprensa local tomou o partido da associação, bem como os jornais da especialidade «O Bombeiro» e «O Jornal do Bombeiro». Este último, respondendo a uma correspondência desta vila publicada no «Universal», de Braga, terminava assim um dos seus vários artigos: «…Entende? Seu bombeiricida. Ponha a gravata, vista o casaco, tire o cigarro de traz da orelha, e depois tem-nos às suas ordens».

A Associação, bem haja, não saiu desprestigiada deste conflito.

Tlão, tlão, tlão… Fogo! Fogo!

Onde é, onde é? É na casa do sr. António Pereira Castro Caldas (Solar de Andorinha). Passou-se isto no dia 8 de Maio de 1890, segundo notícia «O Comércio do Vez». Os bombeiros não tardaram e creio que foi a sua primeira saída em serviço. Mas não foi desta vez que receberam o «baptismo de fogo». Quando compareceram já o pessoal da casa dominara o princípio de incêndio e não chegaram a trabalhar.

O baptismo deve ter sido em 4 de Julho desse ano. Provocado por uma explosão, ateou-se um incêndio na oficina do fogueteiro Bonifácio Ferreira, no lugar do Fojo Arrancado (freguesia de Vilafonxe). Embora conduzindo a bomba por maus caminhos, os nossos bombeiros esforçaram-se por chegar o mais depressa possível, dirigidos pelo 1.º comandante Vergílio Martins da Costa. O jornal «O Arcoense», faz as mais elogiosas referências ao comportamento dos nossos «soldados do Bem».

Inauguração solene

A inauguração solene da «Companhia dos Bombeiros Voluntários», só veio a fazer-se no ano de 1890, coincidindo com as festas em honra de N.ª S.ª da Lapa, que a Associação escolheu para sua padroeira. Conta-nos a imprensa da época que, de manhã, houve salva de 21 tiros e depois arruado pela banda arcuense tocando o hino dos Bombeiros. Às 9 horas missa, com os amadores do «Orfeão Arcoense», sermão pelo Pe. Eduardo Cunha Cerqueira (notável orador nosso conterrâneo) e bênção do material pelo arcipreste Pe. António Luís Borges Saraiva. De tarde, sessão solene da Câmara. À noite iluminação, exercícios públicos, bazar, fogo de artifício e marcha «aux flambeaux».

Bons tempos…

- Festas e mais festas… - Quem não aparece, esquece…

Com esta primeira festa criou-se o costume de solenizar, todos os anos, o aniversário da colectividade por ocasião dos festejos em homenagem à sua padroeira. Depois, este costume sofreu um grande interregno. O jornal «A Concórdia» nos seus números 27, 29 e 31 (1920), refere que os bombeiros festejaram nos dias 26 e 27 de Junho desse ano, o seu aniversário, o que já não faziam desde 1908 por falta de casa própria. Houve várias solenidades e um simulacro de incêndio na casa da sra. D. Carolina Schiapa Azevedo, dirigido pelo comandante Bento Rodrigues de Matos, (mais conhecido por Bento Seleiro) cuja dedicação deixou merecida fama. Bons tempos…

Já que estou no capítulo «festas», citarei outras três, muito notáveis. A primeira foi em 26 de Junho de 1897, para bênção da bandeira do corpo activo. Sabem quem a ofereceu?

As damas arcuenses

Ainda existem os restos mortais dessa rica bandeira, rica no valor material e artístico e rica no gentil significado.

Organizou-se um luzido cortejo que foi até à Lapa. À frente a banda arcuense, depois um grupo de distintas damas (e havia-as, como ainda há, muito formosas, elegantes e caritativas); depois a Direcção dosBombeiros, sócios, Autoridades, Direcção do Monte-Pio, etc. Ali, com os bombeiros em continência e os assistentes de cabeça descoberta, fez-se a entrega, depois de benzida, ao porta-bandeira. Coube essa honra ao bombeiro João Peixoto. Faço ideia como ele não estaria! O coração a querer saltar-lhe fora; as lágrimas a correrem, indiscretas; as mãos trementes de comoção…

Seguidamente, o cortejo dirigiu-se ao teatro (já erigido de novo) onde houve sessão solene. Falaram os dr.s Assis Teixeira, João Cerqueira Machado, Albano Amorim e Alberto Lima. A meio da sessão, o mimoso poeta Avelino Dantas (natural de Paredes de Coura, mas que residiu entre nós bastantes anos) recitou uns versos de sua autoria, dedicados às damas ofertantes da bandeira e aos bombeiros:

SAUDAÇÃO

Senhoras escutai: A cintilar

Como por entre a bruma o sol cintila…

Raiou – misto de sol e de luar –

A ideia que as sombras aniquila.

Bendita ideia, ideia que fulgura,

Ideia de açucenas e de rosas

Tam suave, tam límpida e tam pura

Como doces visões religiosas.

Ei-la! Quem a inspirou? A Caridade.

Quem lhe deu forma e cor? O Coração.

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Eu te saúdo, pois, humanitário

Obreiro de ideal alevantado.

Beijo-te as mãos bombeiro voluntário,

Como crente n’um templo ajoelhado.

À noite a sede ostentava uma lindíssima iluminação concebida por um bombeiro e que causou verdadeiro assombro. Bons tempos…

A segunda das festas que desejo referir, efectuou-se no dia 9 de Outubro de 1927. Houve arraial e venda de flores por gentis meninas que apuraram um muito apreciável total. Constou ainda de: missa cantada na Lapa e procissão; sessão solene no Teatro; copo-d’água na Câmara; gincana de automóveis; tiro aos pombos; e parada. Bons tempos… bons tempos…

A terceira é mais recente e por certo muitos ainda se recordam dela. Foi no dia 30 de Junho de 1935. Presidiu o Governador Civil e compareceram as diversas corporações de bombeiros voluntários do distrito. Houve cortejo imponente, parada e outras solenidades. Bons tempos…

Quem não aparece, esquece…

Como vimos, o antigo costume de comemorar a fundação dos bombeiros no mês de Junho, em que se celebravam também festejos em honra da padroeira N.ª S.ª da Lapa, manteve-se durante uns anos; sofreu uma interrupção, reatou-se de novo e voltou a caducar, quem sabe se definitivamente. Mas é preciso que os bombeiros apareçam à sua padroeira, representada numa imagem pequenina mas lindíssima, talvez a de mais fina escultura de todo o nosso concelho. Segundo consta, foi trazida por um frade de Varatojo (Frei Angelo de Sequeira) quando aqui veio em missão pelo ano de 1758. Colocada na antiga capela de S. Braz, logo atraiu muitos devotos, a ponto que se julgou a capela muito pequena e se demoliu para dar lugar à actual capela da Lapa. É preciso que os nossos bombeiros lhe apareçam, ao menos de longe em longe, em formatura e traje de gala, e ali rezem para que ela os ampare no perigo, os guie nos salvamentos, ilumine os corações esquecidos ou frios que têm por dever contribuir para o engrandecimento duma instituição que zela, noite e dia, pelas nossas vidas e pelos nossos patrimónios.

Os sócios fundadores

Seria meu desejo deixar aqui consignados os nomes de todos os sócios fundadores, bem como os de todos aqueles, ou aquelas, que com donativos, ou por qualquer outra forma, contribuíram para a fundação desta humanitária colectividade. Não me é possível, porém, satisfazer integralmente este desejo – melhor: este dever – porque não encontrei registos nem actas, nem encontrei no noticiário dos jornais que pude ter à mão, os indispensáveis elementos.

Tenho que contentar-me, apenas, em mencionar os nomes dos sócios subscritos do pedido de aprovação dos estatutos, e em dizer que, quanto a donativos, consta que não faltou, como sempre, o dinheiro brasileiro.

A lista desses subscritores vem ao «Estatuto» de 1889 e na reimpressão que dele se fez em 1916. Já são raras estas duas edições e por isso transcrevo a referida lista.

Imaginemos um quadro de honra emoldurado a ouro, com um laço de crepes a um canto, e inscrevamos em boa caligrafia gótica os seguintes nomes: Silvestre António Saraiva, Manuel Palhares Nogueira Falcão, Baltazar José da Silva, António José Fernandes, Bento Rodrigues de Matos, António Luís Dionísio Mendes, José Antunes da Silva, Silvestre Guilherme da Cunha, Augusto de Sousa e Silva, Vergílio Martins da Costa, Alexandre de Sousa e Silva, Alexandrino Augusto da G. Fernandes, Manuel José Leitão, João Cândido de Gusmão e Vasconcelos, Manuel Gonçalves de Oliveira, Francisco da Cruz Costa Leite, Joaquim Pereira dos Santos. Juntem-se mais dois nomes, que não estão nesta lista mas figuram na primeira Direcção: Francisco Xavier de Araújo, Manuel Pereira de Sá Sotto-Maior.

Já morreram todos! Que descansem em paz! Deixar o seu nome ligado à fundação duma colectividade humanitária, como a de bombeiros voluntários, já não é pequena honra.

Diz o filósofo que, na nossa passagem por este vale de lágrimas, pelo menos se deve deixar ficar: um filho, um livro e uma árvore. Ora os bombeiros velam pela vida do filho (que prolonga o nosso nome de família), pela conservação do livro (que perpetua um pouco do nosso espírito) e da árvore (que nos dá alimento). É, pois, uma altíssima missão.

O primeiro «Corpo Activo»

Existe na Associação um velho registo, de onde se podem extrair, sem grande receio de errar, os nomes dos bombeiros que constituíram o primitivo «corpo activo». É, talvez, uma lista um pouco longa para figurar neste modesto estudo. Sinto-me, todavia, na obrigação de a publicar, prestando-lhes, assim, uma humilde mas justíssima homenagem.

Ei-los, os altivos pioneiros, aspirante a heróis, que fizeram o juramento de se sacrificarem pelos outros, e vestiram, pela vez primeira, a farda da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Arcos deValdevez: José Maria da Rocha Varajão, Luís Maria Camanho, José Alfredo Pereira Coelho, António José da Cunha, João da Costa Magalhães, Artur José Dantas, António José da Silva, Luís António Gomes, José Mendes de Sousa, Agostinho da Cunha, Manuel Esteves, José Antunes da Silva, Manuel da Silva Almeida, José Bernardino Pereira, José Maria d’ Andrade, Pedro José Pereira, Bento Rodrigues de Matos, António Manuel Afonso, António Esteves, José Maria d’ Abreu, António Sebastião de Araújo, Manuel José Leitão, António da Silva, João d’ Abreu, Francisco Rodrigues de Matos, Manuel Gonçalves d’ Oliveira, João da Silva, Júlio César Valério, Augusto de Sousa e Silva. Acrescentem-se o 1.º Comandante, Vergílio Martins da Costa e o 2.º, João da Rocha Vaz.

2 minutos de silêncio

Creio que já morreram todos, também.

Pouso a minha pobre caneta… Parece-me ouvir o clarim tocar a sentido. Levanto-me e perfilo-me. Durante dois minutos paro de escrever e invoco a memória de alguns deles, que ainda cheguei a conhecer. Luís Maria Camanho (o Luizinho d’ Agueda), meu tio, sempre alegre e inventivo; o Manuel Oliveira, distinto amador dramático que ensaiou «A Espadelada» onde estive para entrar; o Magalhães a cuja loja ia comprar hóstias; o José Bernardino, conceituado comerciante, sempre aprumado; o Júlio Valério, outro apreciável amador dramático, coleccionador de cerâmica, sempre pronto para todas as iniciativas; o Bento Seleiro, em cujas carruagens tanto viajei; o Augusto Silva, sempre espirituoso e sonhador; etc. etc.

Bons tempos, bons amigos, bons corações… Quem reza por vós a Deus?! Quem desfolha por vós as pétalas roxas da saudade?!...

Espírito de artista não exclui valentia e abnegação

Nesta inovação referi que alguns desses primitivos soldados do Bem, eram amadores dramáticos. Enganei-me, porém, ao dizer que Manuel Oliveira fora o ensaiador da «Espadelada» pois quem dirigiu os ensaios foi o irmão José de parceria com Júlio Valério. Em compensação, pode acrescentar-se à lista desses amadores o nome de Augusto Silva, o do 1.º comandante Vergílio da Costa (muito talentoso nessa arte) e o 2.º comandante João Vaz (bom declamador). Todos eles entraram, com muito agrado, em várias receitas de caridade e promoveram outras onde, colaboraram como ensaiadores, pontos, contra-regras, etc. Mas, quando era preciso, depressa vestiam a farda de bombeiros. Como se vê, o espírito de artista não exclui a valentia e a abnegação.

Vagas logo preenchidas

Pouco depois da formação do primeiro Corpo Activo, deram-se, por este ou aquele motivo, algumas vagas que logo foram preenchidas por outros voluntários. Esses novos recrutas quase se podem considerar como pioneiros e por isso lhes rendo a homenagem de relembrar os seus nomes: Francisco de Matos, Vidal António de Brito, Peixoto Hipólito Dias Gonçalves, António Sebastião d’ Abreu, Manuel António Martins, Júlio Gomes d’ Abreu Brandão, António dos Santos Rebola, António José Pereira.

Ela, outra vez…

«O Comércio d Vez» no seu número de 26-06-1890, falando da inauguração do novel organismo, terminava o artigo fazendo votos «para que este Corpo de Bombeiros mereça as bênçãos celestes, e que a sua existência se radique nesta localidade, onde parece que pesa um malfadado poder oculto, que se apraz em cortar sempre pela base, tudo quanto se tenta construir pelas vias do verdadeiro progredimento e concorra para engrandecer e abrilhantar esta importante povoação».

Manifestava-se aqui, claramente, um certo receio. E tinha razão o articulista. Em princípios de Junho de 1892, o mesmo jornal publicava um edital anunciando que fora dissolvido o Corpo Activo dos BombeirosVoluntários e por isso se convidavam as pessoas que assim o desejassem, a inscrever-se.

Tricas políticas não eram estranhas a estes factos.

«O Arcoense», por esta altura, noticiava que o 1.º comandante se exonerava e com ele quase todos os bombeiros. A Direcção abrira nova matrícula e já contava com grande número de inscrições. De facto, no dia 16 desse mesmo mês de Junho de 1892, procedeu-se à instalação da nova Corporação. Para 1.º Comandante foi nomeado Alexandrino Augusto da Cunha Fernandes e para 2.º Miguel Maria Teixeira Coelho.

Muitos dos que se haviam afastado não tardaram em voltar. A alma arcuense estava alerta e não faltou à chamada.

Um Ilustre bombeiro filho de Távora

Abro aqui um pequeno parêntesis para falar de um bombeiro que não pertenceu à Corporação da nossa terra, mas nem por isso deixou de a honrar. Chamava-se José Bernardino Amorim Barbosa. O Almanaque dos Bombeiros, do ano de 1891, publicava o seu retrato e rendia muitos elogios às suas qualidades, como pessoa e como bombeiro. Foi o fundador e comandante dos Bombeiros Voluntários de Belém (Lisboa) e mestre, muito estimado, na fábrica de bolachas Conceição Silva (também na capital).

A alma arcuense, de vez em quando, também dá o seu passeio lá por fora.

Factos importantes em 1892

Além da dissolução do Corpo Activo e da sua rápida reorganização, este ano de 1892 ainda havia de ser assinalado por dois outros acontecimentos importantes. O primeiro foi a vinda até nós (para instruir a nova Corporação), de um dos mais célebres bombeiros portugueses.

Rodolfo José de Araújo

Nessa altura já tinha uma certa fama, mas ainda era apenas um simples graduado. Poucos anos depois viria a ser Comandante dos Bombeiros Voluntários do Porto, onde deixou uma luminosa folha de serviços. Discípulo e colaborador do célebre Guilherme Gomes Fernandes (cuja efígie anda em selos postais), com ele compartilhou dos triunfos alcançados em França. O Concurso de Paris, em 1900, foi, como é sabido, retumbante, e não será e mais relembra-lo em duas linhas. A Portugal coube executar o tema em 2.º lugar. A primeira nação levara coisa como que 10 minutos a concluir esse exercício. Seguem-se os nossos bombeirosportuenses e gastam apenas 2 minutos. Foi um delírio. As restantes nações ficaram tão perplexas que não se sentiram com coragem, em face de tal precisão e desenvoltura, de se exibirem. Desistiram todas.

O Porto, como acontece em muitas outras terras, não foi muito grato para com tão prestigioso servidor, pois escolheu uma modesta travessa para lhe apor o seu nome: Travessa do Comandante Rudolfo de Araújo.

Pouco tempo esteve entre nós, mas ainda me lembro de ouvir dizer que deixou boa escola. O outro acontecimento foi a chegada da

Bomba n.º 2

Saudada com música e foguetes cá na tarde do dia 30 de Outubro de 1892. Esteve para servir logo no dia seguinte, num princípio de incêndio numa das casas baixas do Espírito Santo, Chegou a sair, mas não foi preciso trabalhar.

Esta nova bomba, que ainda está ao serviço, foi construída na mesma oficina onde fora a n.º 1. Todavia, o construtor e inventor da primeira, artista que deixou merecida fama, já havia falecido. Talvez, por isso, não saiu tão boa como a anterior e causou várias sensaborias. A maior, foi, de certo, a de ficar lembrando que se vendeu a melhor e se conservou a peor.

Julgo que esta bomba n.º 2 tenha custado 470$000 reis. No livro de actas d 1893 (que é o mais antigo do arquivo) se lê que em Abril se pagara a 2.ª prestação de 156$665 reis e as despesas de transporte até Braga (e do Pessoal que acompanhava a bomba) que importaram em 9$780 reis. Bons tempos…

A Associação lutava com muitas dificuldades financeiras e por isso, com vista à 3.ª e última prestação que só se vencia em Outubro, resolveu rifar a obra «História Universal» de Cantù, que fora oferecida à Associação não sei por quem. O sorteio só veio a fazer-se em 10 de Janeiro de 1984, e o contemplado foi João Lima (da Comenda).

Além disso, a Direcção, a que presidia o dr. Gaspar de Azevedo de Araújo e Gama, resolveu apelar para os arcuenses residentes no Brasil. Nesse sentido oficiou a Luís Maria de Araújo (Pará) e Manuel Bento Fernandes da Rocha (Ceará). Também oficiou a S. Magestades.

Não foi em vão. Embora com as naturais demoras, D. Carlos presenteou a Associação com 40$000 reis, e D. Maria Pia com 50$000 reis.

Veio também algum dinheiro do Brasil, onde a alma arcuense não falecia.

- A propósito do material, fala-se do dinheiro brasileiro

Como já disse, a bomba n.º 1 veio em 1889, e com ela deve ter vindo também o carro do material, pois é esse o ano que ele orgulhosamente ostenta, em algarismo de origem. Ainda está ao activo e para a época, era bastante completo. Conduz croques, serrotes, trados, escadas italianas, tanques de lona, machados, pícolas, enxadas, ganchos e desforradeiras. Suponho que por essa altura também vieram cintos e capacetes, mas não tenho dados seguros a tal respeito.

Em 1892, como também já referi, chegou a bomba n.º 2. Com este material e com outros utensílios que se foram adquirindo, a nossa Associação, orgulhava-se de ser uma das mais bem apetrechadas da província. Os nossos bombeiros, além do risco da própria vida… também enriqueciam, conforme as suas posses, o património da colectividade. Por 1893, o primeiro Comandante Vergílio da Costa, ofereceu um novo clarim. Osbombeiros Alberto Manuel Rodrigues, Luís Maria Camanho e Manuel António Martins, oferecem várias miudezas que eles próprios construíram, e um engenhoso mostrador para o relógio da Estação.

Mas as coisas não duram sempre. Em 1895 já havia necessidade de substituir os cintos, que não ofereciam segurança. Mandou-se vir do Porto um dos que usavam os bombeiros municipais, para modelo. E o primeiro patrão Bento Rodrigues de Matos (o Bento Seleiro) encarregou-se de fazer os cintos, que assim ficaram muito mais baratos e, segundo a opinião de pessoas competentes ficaram mais perfeitos, seguros e completos. Importaram sem 3$000 reis, cada um.

Bons tempos…

Em 1902 foi preciso novas fardas. Custaram 438$065 reis. Aquilo é que eram tempos.

Os capacetes, coitados, em 1907, sentiram-se cansados (muito fizeram eles!) e fora de moda. Uma comissão de devotados arcuenses (não pude apurar os nomes) promoveu uma subscrição (onde o dinheiro brasileiro fez figura) e mandou fazer na Casa Moreira Couto, d Porto, uns novos capacetes, segundo desenho do 1.º Comandante Alfredo Rodrigues. Esteve em exposição na montra da loja de Acindino Pacheco, a dizer a quem passava: Arcos de Valdevez também tem bombeiros voluntários.

Mas a alma arcuense sonhava com uma auto-bomba e com a grande ajuda do dinheiro brasileiro e da nossa Câmara, realizou-se esse sonho no dia 31 de Dezembro de 1934. Foi dia de desta, com sessão na teatro, música e foguetes, e, nos dia seguinte solenidades na Lapa, pregando o falecido Pe. Casimiro Guimarães. Salvo erro, era presidente da Direcção o dr. António Faria Lima e 1.º Comadante Acindino Pacheco. Primeiro comprou-se um «chassis» de carro particular e mandou-se, depois, carroçá-lo a Vila Nova de Gaia, na Casa Granjo, a quem se vendeu a Bomba n.º 1. Quanto custou, ao certo, a auto-bomba e por quanto se vendeu a manual, não sei, porque não há no arquivo, nem livros nem documentos desses data.

Não foi feliz a nossa Associação com a aquisição da nova viatura, pois deu lugar a duas multas e acabou por ser rejeitada na vistoria, por ter cerca de 1.700 quilos a mais. Teve que ser vendida e em 1945 lá se foi, numa má transacção, por 25 contos, o «chassis» e os pneus. Com eles foram os sonhos da alma arcuense, que, todavia continuou vigilante.

Vendida a auto-bomba, de triste memória, logo se pensou em adquirir outra, os 25 contos, produto dessa Vanda, não chegavam a nada, mas a Direcção Geral do Serviços de Incêndios oficiou a dizer que contribuía com 40 contos e a esperança renasceu. Era pouco, ainda, e toca a lançar uma subscrição. Novamente o dinheiro brasileiro se apresenta à frente da lista. Mas só no dia 11 de Abril de 1944 é que foi, finalmente, benzido o novo pronto-socorro. Houve Missa Campal no Senhor do Calvário e, depois da bênção, o falecido clarim José Luís de Carvalho – sapateiro e filósofo – pronunciou um originalíssimo discurso que ficou célebre. Pena tenho de o não ter ouvido, mas consta que há quem tenha apontamentos dessa curiosa peça oratória. Quem será?

Depois realizou-se uma sessão solene no nosso teatro, em que falaram diversos oradores, entre os quais o dr. António Cândido da Silva Dias. Presidente da Associação, e o sr. Abílio Rocha Gomes, 1.º Comandante. E aí temos um Studbaker, todo fresquinho, muito bem equipado com duas moto-bombas, manga de salvação, escadas portuense e de ganchos, bomba de mão, nó de cadeira, picaretas, pás, etc., etc. Custou cerca de 90 contos.

Para completar este meu sucinto inventário do material, falta-me ainda falar dos capacetes de gala e da sirene.

Esses capacetes, que tão grato nos é ver nos grandes dias, foram comprados em Agosto de 1926 à firma Manuel da Silva Coelho, do Porto. Importaram, juntamente com as charlateiras, em 3.750$00.

Quanto à sirene, fez-se mais uma vez, uma subscrição. E, uma vez mais, o dinheiro brasileiro figurou no primeiro plano. Instalou-se no Teatro, e pelos princípios de Setembro de 1949 lançou o seu primeiro grito, não aflitivo, mas de festa. Em Maio de 1950, por falta de condições acústicas e de segurança, mudou-se para o edifício dos Paços do Concelho, onde hoje se encontra no seu doloroso quarto de sentinela. Custou cerca de 12 contos.

Há, por certo, terras mais infelizes, que estão peor apetrechadas do que a nossa terra quanto a material, ou que não têm, sequer, Bombeiros Voluntários.

Podemos, portanto, ter certo orgulho no que possuímos, mas ainda é pouco. Não há capacetes nem fardas, de serviço, suficientes, porque não são eternos. A metragem de manga (que também não dura sempre) precisa ser aumentada. Não temos escada Magirus, nem ambulância, nem outros utensílios que fazem falta.

Tenho, várias vezes, salientado a assistência que o dinheiro «brasileiro» tem prestado a esta nossa humanitária colectividade. Curvo-me, não perante o dinheiro, mas perante as generosas pessoa que o desembolsaram, numa alta compreensão da nobre faculdade que Deus nos deu e se chama Altruísmo.

– E o americano?

E o dinheiro «americano?». Vão por certo responder a esta pergunta os nossos irmãos que mourejam em terras da América do Norte. Qual será o primeiro a ter o seu retrato na brilhante galeria que a Associação já possui? Consta que um deles, quando voltar, pensa trazer uma Ambulância. Não se arrependa dessa caridosa ideia. Por certo outros patrocínios o ajudarão.

Quem sabe se amanhã tocarão os sinos da igreja da vossa freguesia e virá alguém à vila premir o botão da sirene… Quem sabe se estarão em perigo os haveres, e até as próprias vidas, dos vossos pais, esposas, noivas, parentes e amigos muito queridos…

A Galeria de Retratos

Na falta de um salão onde a colectividade pudesse coleccionar, com outra pompa, os retratos dos seus beneméritos, estão estes dispostos nas paredes da Secretaria, como testemunhas mudas e bondosas do que ali se resolve em prol do progresso dum organismo para o qual muito contribuíram.

Quem entra nessa modesta mas simpática dependência, se levantar a vista depara com uma série de retratos que parecem dizer: «atentai no nosso exemplo».

Quem são? O que fizeram?

Não foi sem alguma dificuldade que consegui identificá-los. Os tempos passam, as gerações também, a memória enfraquece, e se o arquivo se não mantém intacto, depois é quase impossível reconstituir a folha de serviços daqueles que a fotografia conservou e expõe à gratidão dos vindouros. Vou, pois, dentro do que pude apurar, fazer umas breves referências aos beneméritos a quem a Associação prestou homenagem descerrando os seus retratos.

Inicio a peregrinação pelo primeiro da esquerda e seguirei em volta:

José Manuel Pereira Fernandes – Foi comerciante na Rua Direita. Espírito empreendedor chegou a presidente da Câmara onde deixou vincada posição. Contribuiu com vários donativos e pertenceu aos corpos dirigentes.

Conselheiro Gaspar de Azevedo de Araújo e Gama – Presidiu a diversas Direcções e ofereceu donativos. Por sua influência obteve a Associação subsídios de D. Carlos e D. Maria Pia e o consentimento do primeiro para presidente honorário.

Francisco Xavier Barbosa do Couto Azevedo – Serviu, como secretário, em diversas directorias. As suas actas, muito bem redigidas, revelam a sua extrema dedicação. Também contribuiu com donativos. Era conhecido pelo Francisquinho da Ponte.

D. Maria Soares Pereira – Foi esposa do grande benemérito que deixou o seu nome ligado à fundação do Asilo de Prozelo. Concedeu 20 contos para a aquisição do primeiro pronto-socorro, mas faleceu antes que o pudesse ver.

Vergílio Martins da Costa – Nasceu no Porto mas veio para a nossa terra como escrivão de direito e aqui constituiu família. Foi o primeiro comandante da primitiva corporação e um dos seus fundadores. Contribuiu, largamente, para o processo da colectividade.

Dr. Manuel Joaquim Ferreira Mendes – Médico muito distinto que deixou bastante fama. Prestou, durante vários anos, gratuitamente, os seus serviços clínicos à corporação a que era muito dedicado.

Alfredo Augusto de Brito Lima – serviu durante vários anos como primeiro comandante. Elaborou o Regulamento do Corpo Activo, publicado em 1895 e reimpresso em 1909. Pela sua vastíssima tolha de serviços, foi nomeado Comandante honorário.

António de Oliveira Leite – Conhecido pelo «Carcereiro», profissão que exerceu por muitos anos. Bombeiro de alma e coração, valeu à colectividade nos momentos mais difíceis. Alistado em 20-05-1900 foi elevado a segundo patrão em 1911, depois subiu a primeiro patrão e terminou em 2.º Comandante. O seu amor à corporação deixou profunda memória. Com 35 anos de serviço recebeu uma medalha de prata que lhe foi aposta pelo Governador Civil, na festa de Junho de 1935.

António Guilherme Martins da Cunha – Conhecido pelo António da Emília. Foi um distinto bombeiro e, durante anos, tesoureiro do cofre do Corpo Activo. Tinha pela colectividade uma grande devoção e lhe prestou muitos serviços. Chegou a 2.º Comandante.

José Martins da Cunha e D. Arlinda Viana Martins da Cunha – Filho e nora do titular do retrato anterior. Contribuíram com 10 contos para o actual pronto-socorro e fecharam com 6 contos a subscrição para a sirene. Este benemérito casal, residente no Brasil, encontra-se felizmente vivo e a Associação por certo espera que ainda não tenha dito a sua última palavra. O seu retrato foi solenemente inaugurado no dia 18 de Janeiro de 1948.

Bento Rodrigues de Matos – Conhecido por Bento Seleiro, profissão que exerceu com rara habilidade. Bombeiro 100%, subiu a escala de 2.º Patrão a 1.º Comandante. Bom soldado, bom instrutor, bom comandante, foi um dos mais distintos bombeiros que colectividade possuiu. Nos momentos graves era sempre dos primeiros a comparecer e a dar o alarme. A Associação ficou devendo-lhe inúmero serviços. Foi um dos fundadores da primitiva corporação, a que pertenceu. A sua personalidade ainda hoje vive fulgurante na lembrança de quem com ele acamaradou e recebeu as suas lições e o seu exemplo.

Francisco Teixeira de Barros Lima – Espírito empreendedor, chegou a ser, para o nosso meio, um grande comerciante. Serviu a colectividade como tesoureiro da Direcção (por 1924) e contribuiu com mil escudos para aquisição de diverso material. Faleceu tragicamente.

Luís Pereira Barbosa Lobo – Foi presidente da Direcção, lugar que exerceu com muito zelo e afecto. Nessa altura contribuiu com 5 contos para compra de material e depois nunca deixou de figurar, com valiosas quantias, em diversas subscrições. A colectividade, regozijando-se porque pertença ao número dos vivos, confia que o seu espírito benemerente a não tenha ainda esquecido.

José João Martins de Pinho (Conde do Alto-Mearim) – Não era arcuense de nascença mas era-o pelo coração e por laços de família. O seu carácter benemerente irradiou por terras do Brasil e Portugal, e Arcos deValdevez foi largamente contemplado. Contribuiu para a fundação e manutenção de diversas instituições locais, entre elas a dos Bombeiros. Não cabe aqui traçar a biografia deste ilustre filho adoptivo da nossa terra, o que farei noutra oportunidade.

Boaventura Gonçalves Roque (Visconde do Rio Vez) – Nasceu em Sistelo, freguesia a que era muito dedicado. Grande benemérito, deixou grande renome no Brasil. Arcos de Valdevez beneficiou imenso desse seu espírito. Fundou uma escola e auxiliou diversos melhoramentos municipais. A Fonte de Salzedas, de afamadas águas, foi construída à sua custa. A Associação dos Bombeiros também, como não podia deixar de ser, mereceu as suas atenções. Recolheu a sua bolsa sempre pronta valiosos donativos e do seu peito forte e aberto, excelentes incentivos.

O património da Associação

Terminei a minha ronda pela galeria dos retratos. Ao contemplá-los, um por um, novamente, todos pareciam dizer-me: «Obrigado! Fizeste bem em falar de nós. Não por nós, propriamente, mas como incentivo para outros. E agora não te esqueças de lembrar que para aqui estamos há muito tempo sem receber a visita de outro companheiro.

O amor à colectividade e o dinheiro brasileiro, estão aqui largamente representados, mas é preciso variar».

Alguém dirá que outros teriam tanto direito a figurar ali, como os que constituem aquela brilhante galeria. Não serei eu a negá-lo. Quantos sacrifícios e dedicações terão passado despercebidos ou ficaram no esquecimento! Mas não me é possível adivinha-los…

Estamos ainda na Secretaria. Lá está, muito orgulhosa, em cima duma colina, uma taça. Vamos ler o que ela diz:

«Taça 1.º Centenário da Cidade de Viana do Castelo – Dia do Bombeiro – 18/08/1948 – 1º. Prémio». Em competição com outras corporações, a nossa, num rasgo de coragem e desenvoltura, conquistou-a brilhantemente. Uma referência para o nosso bombeiro Francisco da Cunha Barros, que se destacou graças à sua coragem e dedicação.

Que eu saiba os nossos bombeiros só entraram num outro certame. Foi nas Festas do Concelho do ano de 1951. Incluída no programa estava a «Tarde dos Bombeiros», no dia 14 de Julho. Havia um simulacro de incêndio e exercícios de destreza. Concorreram várias formações do distrito, a quem foi distribuído o tema com a devida antecedência. Ainda está na memória de todos a maneira como os nossos se exibiram. Sem desprimor, foram mais uma vez os melhores. A taça conquistada, foi oferecida, num gesto de gentileza e camaradagem, aos bombeiros de Viana do Castelo. Dois concursos, dois primeiros lugares. Está tudo dito.

Numa das paredes está um diploma de louvor, passado pela Liga dos Bombeiros Portugueses. Na respectiva pasta, um ofício de louvor da nossa Câmara, pelos serviços prestados no incêndio dos Paços do Concelho, em Janeiro de 1948. Na gaveta duma das secretárias, estão os restos mortais da bandeira oferecida pelas damas arcuenses. Elas sabiam que os bombeiros estavam, e estão, sempre prontos a zelar pelos seus lares, por muitas coisas que são gratas aos seus corações. Estarão elas agora esquecidas disso?

Nem tudo lembra é certo, mas as nossas damas sabem, muito bem, que Arcos de Valdevez, também tem Bombeiros Voluntários.

Uma sede em bolandas, por causa a Ela…

A Secretaria está enlatada entre duas outras dependências: a que serve de residência ao quarteleiro e um salão para reuniões, festas e divertimentos. É isto a actual sede da Associação.

Como já disse, a primitiva sede (provisória) foi nos baixos de uma residência particular que ainda não consegui identificar, mas julgo ser o prédio hoje pertencente à Exma. Sra. D. Maria Nazaré Barros Lima, na Rua do General Plácido Abreu, esquina para o largo do Dr. Pinto Osório. Depois passou para a actual sede, construída pelo primeiro proprietário especialmente para esse fim. Mas, por politiquice e para montagem dum estabelecimento (Casa Havanesa), teve que sair e foi para o pátio da casa acima referida, onde suponho que já estivera. Conheceu, a seguir, mais dois poisos. Um deles foi na Praça Municipal onde hoje está a Tesouraria de Finanças e onde fora a antiga cadeia. Demolida esta e levantando o novo edifício, os baixos foram destinados à associação e construídos com esse fito. Mas a politiquice só a deixou lá estar uns escassos meses. E aí vai ela com o material às costas para a Capela de N.ª S.ª da Conceição, essa infeliz capelinha românica que tem, coitadinha, servido para tudo. Ali se deram agitadíssimas assembleias, onde a politiquice de então deu largas às suas paixões. Por fim voltou à actual sede alugada e ali se tem mantido há bastantes anos. Até quando? Até ter uma sede própria e condigna e isso está na mão dos arcuenses. Esse dia radioso há-de surgir, estou certo disso.

Entremos agora no salão. Enquanto aqui estamos podemos ouvir um pouco de música. É só desandar o botão do aparelho de telefonia. Dantes, este salão estava dividido em duas partes: uma soalhada e outra térrea onde estavam as bombas manuais. Agora forma uma só dependência. Aqui se têm dado animadíssimos bailes sobretudo na Carnaval. Este ano não houve, mas não digo porquê…

Várias Relíquias

Sem sair da Secretaria, ainda podemos encontrar outras relíquias além dos retratos. Quem ali entra, logo dá de cara com uma tela que bem se presta ao ambiente. Enquadrados num paquife ornamental lá estão pintados, com muita nitidez, vários utensílios: 1 capacete de serviço a servir de elmo; e, entrelaçados numa espia, duas machadas, um facho simbólico, uma escada de gancho e uma destorradeira. Foi oferecido (está lá escrito) por Francisco Xavier do Couto Azevedo, de quem já falei. Tem uma assinatura: P. J. Pereira Fernandes Feiz (abreviatura de Fernandes?). Será o nome do autor? Quem era? Seria o pai de Alberto Rodrigues que também foi pintor (executou o retrato do Dr. Ferreira Mendes) e 1.º Comandante? Não sei responder.

Num escaparate está o vistoso e rico estandarte, de cetim de seda pura. Foi mandado fazer à Casa Quaresma, do Porto, em 1941, por uma Direcção a que o Sr. Henrique de Oliveira Codeço. De um lado tem um emblema com a legenda: «Vida por vida»; do outro, as modernas armas do concelho. Pendentes, estão várias e medalhas, comemorativas de saídas para festas e congressos. A primeira dessas saídas, de que tenho conhecimento, foi no dia 27-12-1903 a Monção, mas não há a fita respectiva. Estão, porém, as seguintes: Festa da Cidade de Vila Real – Parada – 1936, Festas Provinciais dos Centenários; Parada de Bombeiros – Braga – 1940; Bodas de Oiro – B.V. de Monção – 19-03-1950. Medalhas: Festas dos Bombeiros da Província do Minho – S. João – Braga – 1950; Bombeiros Voluntários de Vizela – 1952.

Como recordação da ida a Lisboa em 08-08-1948, por ocasião do VIII Congresso promovido pela Liga dos Bombeiros Portugueses, está uma fotografia oferecida por um arcuense, o Sr. Laureano da Silva. Ainda posso apontar duas outras saídas: a Guimarães, em Julho de 1948 (homenagem ao 1.º Comandante daquela corporação); a Viana do Castelo (Dia do Bombeiro), nas Festas da Cidade, em 19-08-1948.

O barracão-fantasma

Ao lado do Teatro está um triste barracão e um pedaço de terreno, ambos pertença da colectividade. É nesse barracão que se guardam as viaturas e restante material de incêndio de que já falei. Está lá também a estragar-se uma marquesa para tratamentos.

Chegou a funcionar, na sede da Associação, um pequeno posto para os primeiros socorros, aplicação de injecções, pensos, etc. Prestou-se, obsequiosamente ao serviço de enfermagem, o Sr. António Moreira Lima, que tinha, e tem, pela colectividade, muita dedicação, Não só prestou esses serviço, como ofereceu algum material cirúrgico, escreveu alguns artigos em prol da Associação e iniciou no jornal «A Vanguarda» uma subscrição para compra de material de incêndio, inscrevendo-se com 20$00 da sua modesta algibeira. Mas a subscrição morreu na casca e o posto extinguiu-se por má vontade do senhorio e poucas condições de existência.

O referido barracão, construído primitivamente para estância de madeiras, serviu depois como garagem e armazém de retém. Hoje encontra-se num estado lastimoso e indigno dos brios arcuenses.

A actual Direcção pensa dar-lhe um pequeno paliativo mas o sonho dourado é construir ali um airoso quartel com o seu esqueleto próprio para exercícios. Não queria morrer sem o ver e tenho fé que N.ª S.ª do Castelo, cuja festa está próxima, me concederá essa graça. Não me esquecerei de lha pedir.

O tal velho barracão e o terreno anexo, foram adquiridos por vinte contos mas ficaram por vinte e cinco. Primeiro deram-se cinco contos de sinal, com a condição de entregar os restantes quinze dentro de 2 anos. Mas a Associação não pôde satisfazer o compromisso e perdeu o sinal. Todavia, a proprietária, lembrando-se talvez do grande afecto que seu falecido esposo nutria pela Associação, e porque ela própria é de bondosos sentimentos, manteve o preço de 20 contos embora a propriedade se valorizasse e valesse um tanto mais. E um dia, há poucos anos, a Associação, muito senhora de si, apresentou-se no notário com vinte notas de mil escudos na carteira, e toca a fazer a escritura. Como arranjou ela essa avultada quantia? É o que vou dizer.

Divertimentos

Ainda no capítulo «divertimentos», podemos incluir o «Teatro Teixeira Coelho», cujo o edifício é hoje pertença da Associação.

Como disse no princípio deste modesto estudo, foi o incêndio do primitivo «Teatro João de Deus» que estimulou, decisivamente, a criação da colectividade. O desaparecimento desse teatro, construído com tanto gosto e sacrifício pela benemérita «Associação de Socorros Mútuos – Monte Pio Arcoense» não fez desanimar os seus dirigentes. O «dinheiro brasileiro» vejo, como que por encanto, auxiliar os seus desejos e no dia 1 de Março de 1891 realizava-se no novo «Teatro Teixeira Coelho», ainda em obras, a primeira récita com o drama «St.º António». Nela colaboraram como figuras principais, Virgílio Mastins da Costa, José Oliveira, Augusto Silva, etc., pessoas em destaque na Associação dos Bombeiros Voluntários.

Quem era Teixeira Coelho? – Perguntará algum leitor curioso. Caetano Teixeira Coelho, cursou Direito, em Coimbra, e foi um dos mais distintos estudantes do seu tempo. Redigiu a célebre revista «Tira-Teimas», órgão da academia de Coimbra, onde inseriu notáveis produções. Não chegou a concluir o curso porque em 1862 foi atacado pela tuberculose e faleceu no ano seguinte.

Das suas produções foram publicados, reunidos num volume, os seguintes trabalhos: «Um lance d’ olhos pela língua» (estudo filológico); «A expulsão dos judeus» (drama em 4 actos); «Considerações d’ um moribundo» (notas soltas); e «As cinzas de D. Pedro V» (em verso). Tenho um exemplar na minha pequena biblioteca.

Pois o «Monte Pio Arcoense», que se fundara por Alvará Régio de 9 de Outubro de 1883 (conforme se vê no exemplar dos Estatutos, que possuo, publicados em 1899), que tantos benefícios prestou e por cujas cadeiras directivas passou tudo quanto tem havido de melhor na sociedade arcuense, quase 60 anos depois sentia-se sem recursos para continuar e dissolveu-se. Segundo os Estatutos os valores resultantes da dissolução eram distribuídos pelos sócios, ou entregues a uma associação humanitária da nossa vila.

Os sócios podiam, portanto, ter vendido o teatro e ficado com o dinheiro, mas preferiram, nobremente, optar pela segunda determinação. Lá está, no átrio, uma simpática lápide a assinalar esse gesto:

«Esta casa de espectáculos foi doada à Associação dos Bombeiros Voluntários desta vila pelos seguintes sócios efectivos do Monte Pio Arcuense cuja extinção se verificou no ano de 1942: Dr. Manuel J. Ferreira Mendes; Dr. Tomaz Norton; Dr. Alberto C. Azevedo Amorim; José Bernardino Pereira; António de Sousa Galvão; A. de Oliveira Leite; José DA Cunha Lima; Eurico Rocha; Henrique Codeço; Francisco António Veloso; Luiz Borges; Manuel José Pedreira; Joaquim Martins; Luiz Rodrigues Galvão; José Alves de Brito Júnior; Alberto Jorge Pereira; Eugénio Amorim; Alfredo G. Pires; Manuel Alves Rebola; António Araújo; José Pedreira Barbosa; José Maria de Abreu.

Honra lhes seja.»

Toques das Sirenes

1 Toque: Chamar motorista

2 Toques: Acidente

3 Toques: Incêndio florestal

4 Toques: Incêndio em habitação (vila)

5 Toques: Incêndio em habitação (aldeia)

10 Toques: Activação do Plano de Emergência Municipal

Informações úteis

Telefone AHBVAV: +351 258 520 300 (Chamada para a rede fixa nacional)

Em caso de incêndio ligue 117

Em caso de emergência ligue 112

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